A invenção do DC Mini, um aparelho que permite a uma pessoa adentrar nos sonhos de outra pode ser a solução de vários problemas psiquiátricos. Mas, ao mesmo tempo pode se tornar uma arma nas mãos erradas. Será que Paprika conseguirá encontrar o responsável pelo roubo do DC Mini?
Sinopse:
Num futuro próximo, o Dr. Tokita (Tôru Furuya) inventa um poderoso aparelho chamado DC-Mini, que torna possível o acesso aos sonhos das pessoas. Sua colega, a Dra. Atsuko Chiba (Megumi Hayashibara), psicoterapeuta e pesquisadora de ponta, desenvolve um tratamento psiquiátrico revolucionário a partir do aparelho. Mas, antes de seu uso ser sancionado pelo governo, o DC-Mini é roubado. Quando vários dos pesquisadores do laboratório começam a enlouquecer e a sonhar em estado de vigília, Atsuko assume seu alter-ego, Paprika, a bela "detetive de sonhos", para mergulhar no mundo do inconsciente e descobrir quem está por trás da tragédia.
Sonhos podem ser manipulados? É com essa premissa que Satoshi Kon constrói o roteiro de Paprika, uma aventura muito diferente que explora o universo onírico por trás do subconsciente das pessoas. Somos arremessados em um mundo confuso onde os símbolos que o gerem são mais importantes do que o ato de compreender o que está se passando. Com Paprika, Kon consegue criar uma história rica em detalhes ao mesmo tempo em que nos faz refletir sobre nós mesmos.
O DC Mini é um aparelho pesquisado por uma empresa que trabalha em psicoterapia e a cura pelos sonhos. Paprika é o alter-ego da Dra. Atsuko Chiba, uma psicóloga dos sonhos. O aparelho criado por Tokita ainda está em fase de desenvolvimento. Por isso, o tratamento que a Dra. Chiba realiza com o policial Tonakawa. Este vem sendo vítima de uma série de sonhos recorrentes que tentam mostrar algum acontecimento de seu passado que ele não consegue entender o simbolismo por trás. É um sonho incompleto e através do aconselhamento feito por Paprika, Tonakawa vai tentar dar um sentido a esse sonho. Mas, tudo começa a complicar quando o DC Mini é roubado. Com uma investigação interna da empresa descobre-se que talvez teria sido o Dr. Himura, colega de Tokita que teria roubado o aparelho. O chefe de departamento dr. Shima é atacado por sonhos confusos em plena luz do dia, revelando que é possível afetar as pessoas sem que elas estejam dormindo. A trama vai se complicando cada vez mais e a ajuda de Tonakawa vai se tornando cada vez mais necessária. Aos poucos os responsáveis pela investigação do roubo do DC Mini vão se dando conta de que as barreiras entre o mundo real e o mundo dos sonhos vão ficando cada vez mais tênues.
O Mad House é famoso por suas animações de ponta. Vários excelentes animes já passaram pelas mãos deles e Paprika não é diferente. Se o objetivo era confundir o espectador isso foi feito de maneira magistral. O espectador já consegue ver ao que a animação veio logo na sequência de abertura. Paprika andando por todos os lados e as pessoas não sabem dizer se ela é ou não real. Ela consegue parar carros em pleno movimento, atravessar por dentro de pessoas ou se fundir com um outdoor. Toda a sequência foi pensada de maneira a confundir, mais do que explicar. Os momentos de sonhos são riquíssimos em simbolismos e referências. Admito não ser muito bom para pegar referências junguianas, mas creio que o símbolo da borboleta tem a ver com mudança e isso vai ser essencial para Tokita, Tonakawa e Atsuki. Mas, existem também muitas referências ao cinema ocidental como cenas de O Guarda-Costas (a do fotógrafo), um de filmes de espionagem que eu acredito ser ou 007 ou Assassinato no Expresso do Oriente e Tarzan. Ah, tem também uma pequena malandragem de Satoshi Kon ao colocar um anúncio de Perfect Blue e Tokyo Godfathers no meio de uma série de cinemas no sonho de Tonakawa (ambas as animações também foram dirigidas por ele).
A trilha sonora de Susumu Hirasawa se concentrou em batidas techno ou digitais. Ela combinou bem com algumas cenas. Por exemplo, a cena em que Paprika se transforma em uma espécie de Saiyuki em cima de uma nuvem voadora ficou sensacional com uma música techno-épica ao fundo. Aliás, a trilha sonora me lembrou muito Ghost in the Shell. A pegada é muito parecida.
Vários temas são explorados ao longo do filme. Um deles é a falta de maturidade de Tokita. Ao criar o DC Mini tudo o que ele queria era que todos pudessem experimentar os sonhos dos outros. Compartilhar sonhos. A forma como ele fala dos objetivos por trás do DC Mini é como uma criança descrevendo o seu novo brinquedo. A personalidade do cientista é jovial e somente muito mais para o final da trama é que ele vai perceber como o seu sonho era bobo e sua máquina começa a ser usada para outros propósitos. Fiquei surpreso com a revelação no final de Atsuko até porque o autor não deixa transparecer tanto assim ao longo do filme, mas okay.
Já Tonakawa é alguém que não consegue seguir em frente. A compreensão de que muitos dos sonhos que temos são deixados para trás não chegou para ele. Ele se culpa por suas escolhas e o sonho incompleto é o reflexo disso. De certa forma, muitos de nós convivemos ou não com coisas que gostaríamos de mudar. Mas, apenas quando nos damos conta de que é preciso viver o presente e deixar as escolhas passadas para trás é que conseguimos amadurecer como seres humanos. Alguns vão alegar que a história de Tonakawa destoa do plot principal, mas eu discordo. Isso porque todos no filme são imaturos principalmente os três protagonistas. Nenhum dos três é sincero consigo mesmo e isso afeta a vida deles de alguma forma. Por isso que a história deles deve se cruzar mesmo. A superação de Tonakawa não vem por causa de Paprika, mas através dele mesmo. O maior obstáculo do policial é ele mesmo por isso ele imagina aquela cena em que ele não consegue capturar o bandido (não é spoiler... tem muito mais por trás daquilo).
Já Atsuko é uma pessoa reprimida. Não é explicado por que ela mantém esse comportamento. Achei isso uma falha de roteiro. Ela é a personagem mais interessante e complexa da animação. Entendo que o tempo do filme não é muito para desenvolver bem os personagens, mas um flashback rápido resolveria. É muito curioso a dualidade formada entre Atsuko e Paprika. Ambas são complementares. Atsuko não aceita a personalidade de Paprika, apesar de precisar dela para realizar as intervenções. Paprika representa a liberdade de emoções; um alguém expressivo, extrovertido e até sensual.
Gostei muito do estilo de narrativa, sempre procurando confundir o espectador. Mesmo a animação utiliza diversos ângulos diferentes. Eu achei até a história bem simples se formos levar em conta a proposta do autor. Entretanto, a maneira como ela é executada é que é a chave do sucesso aqui. É a união entre as composições de cena, a construção de personagens, a trilha sonora e a narrativa. Quando o diretor une esses quatro elementos ele forma um todo único.
Paprika é uma excelente animação e não à toa recebeu inúmeros prêmios. Com uma história que vai se desenvolvendo aos poucos ele mantém o espectador na tela até o último segundo. Achei que ficou faltando um pouco mais de construção da protagonista, mas não era algo que seria tão perfeito se formos levar em conta um filme de 90 minutos. Os demais personagens tem suas motivações muito bem criadas. Gostei também dos pequenos easter eggs que o diretor joga no meio da história. Faz com que tenhamos uma segunda leitura ao nos obrigar a prestar mais atenção ao fundo.
Ficha Técnica:
Nome: Paprika
Diretor: Satoshi Kon
Produtores: Jungo Maruta e Masao Takiyama
Roteiristas: Seishi Minakami e Satoshi Kon
Baseado em Paprika escrito por Yoshitaka Tsutsui
Estúdio: Madhouse
País de Origem: Japão
Tempo de Duração: 90 min
Ano de Lançamento: 2006
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