A humanidade descobriu que não está sozinha no universo. Agora, com uma situação catastrófica iminente, a humanidade tenta se preparar para o que há de pior: a Batalha do Fim dos Tempos.
Sinopse:
Depois de "O problema dos três corpos", a humanidade se prepara para a iminente invasão alienígena. A Organização Terra-Trissolaris ― formada por habitantes da Terra que traíram seus iguais para se associar aos alienígenas ― pode ter sido derrotada, mas a presença de partículas subatômicas, os sófons, revela todo o conhecimento da humanidade para os invasores, e as defesas terráqueas são um livro aberto para os trissolarianos. Nesse contexto, em que só a mente humana é segura, é montado o Projeto Barreiras: quatro pessoas serão encarregadas de pensar em uma estratégia para a salvação do mundo. A Barreira está completamente isolada, protegendo seus pensamentos do restante da humanidade, mas até que ponto é possível guardar um segredo?
ATENÇÃO: TEM SPOILERS DO PRIMEIRO VOLUME. SE AINDA NÃO TIVER LIDO, PARE AQUI!
Este segundo volume retoma os acontecimentos do final do primeiro volume: com Trissolaris a caminho da Terra, a humanidade precisa se preparar para o embate contra uma força muito superior. É uma longa jornada rumo ao fim dos tempos. Os sófons impedem o desenvolvimento de altas tecnologias e tudo o que a humanidade tem para trabalhar é a ciência de base. O foco principal deste segundo volume é no Projeto Barreiras, quatro pessoas que são encarregadas de buscar uma solução para o problema, sendo que o seu pensamento se torna lei. Como a humanidade é constantemente observada, estas quatro pessoas não podem revelar seus verdadeiros objetivos a ninguém, podendo executar seus planos e mover recursos da forma como achar melhor. O estrategista Tyler, o revolucionário Rey Diaz, o neurocientista Hines e o instável Luo Ji.
A escrita de Cixin Liu assume um tom diferente neste segundo volume. Enquanto que no primeiro ele se preocupou muito com a revolução cultural na China e em como isso vai afetar a descoberta de Trisolaris, aqui o foco maior é nas quatro Barreiras. Todos ganham um pouco de espaço. Uma escrita mais alongada e temos pouco capítulos com várias mudanças de foco narrativo entre os personagens. Achei até que o autor poderia ter criado capítulos menores, mas a escolha foi a que era possível dentro da proposta que ele tinha feito. Por essa razão, achei a escrita desse segundo volume inferior à primeira no sentido de que a gente sente o peso das palavras aqui. O desenvolvimento acaba sendo mais demorado e a leitura flui com mais vagar. Entretanto, é preciso destacar a beleza da construção de frases do Liu aqui. Alguns parágrafos são quase como um pintor de paisagens construindo um belo cenário. As cenas entre Keiko e Hines e Luo Ji e Zhuang Yan são lindas. No primeiro caso, posso destacar uma bela noite em uma mansão ao estilo japonês cercado por uma floresta de bambus onde o casal discute os próximos passos um para o outro. Ou a maneira como Luo Ji descreve Zhuang Yuan como se fosse uma bela pétala de rosa no meio de uma imensa e límpida lagoa.
"Ele ficou surpreso ao descobrir que a vida que ele lembrava também tinha começado na areia. Foi em sua própria pré-história, em um lugar que ele não recordava e com pessoas de quem não se lembrava, embora fosse nítida a memória da margem arenosa de um rio."
Estamos diante de uma narrativa geracional. Sim, senhores, pura inspiração em Isaac Asimov, mas à moda oriental de conduzir as coisas. E o curioso é que o autor brinca com isso ao citar alguns easter eggs ao longo da narrativa como Tyler oferecendo a um certo sábio na montanha a possibilidade de se transformar em um Hari Seldon, ou Hines citando a criação de um monólito negro para guardar o conhecimento da humanidade (Arthur C. Clarke nesse caso). Cixin Liu usou a forma geracional para criar a história ao colocar os personagens como meras engrenagens em algo maior na narrativa que é o confronto entre Trisolaris e a Terra, ou no desenvolvimento do próprio ser humano diante de uma crise. A história se passa em dois momentos específicos: um no começo da Era da Crise e outra duzentos anos no futuro (apesar de haver algumas paradas pelo meio do caminho). Essa forma de conduzir a narrativa acaba obrigando o autor a criar alguns núcleos de personagens bem distintos e, mesmo levando alguns personagens para o futuro através da criogenia, a percepção geral é que ele realmente mudou a forma como a humanidade enxergava a invasão iminente.
"Você é como o espaço em branco em uma pintura tradicional: pura, mas infinitamente interessante para um olhar maduro."
Podemos dividir a narrativa em duas partes: o temor e o projeto Barreiras e a fase áurea e a queda repentina. Na primeira parte temos toda a questão do planejamento das Barreiras e em como cada um falha ou é bem sucedido à sua maneira. É como se Liu colocasse um dilema a ser resolvido e cada um tentasse resolver o problema com sua própria especialidade. Tyler busca confrontar Trisolaris com uma força muito superior (ou seja, a agressão pura e simples); Rey Diaz tenta o tudo ou nada, ou seja, se eu não posso ter algo, você também não terá; Hines tenta convencer a si mesmo e ao mundo inteiro que o impossível é possível, mesmo que ele tenha que gravar isso na cabeça das pessoas. E Luo Ji... bem... este eu comento depois. É incrível que se pensarmos logicamente as três Barreiras apresentaram soluções dentro daquilo que eles se propunham a fazer. À medida em que vamos conhecendo os personagens, vamos deduzindo os próximos passos. O momento final de Rey Diaz era totalmente esperado porque ela condizente com as suas preocupações. Quem realmente me surpreendeu foi o Destruidor de Barreiras de Hines. Até achei que não veríamos mais um Destruidor depois do que acontece ao Rey.
Se eu reclamo do Asimov por não trabalhar personagens, Liu é o oposto e isso é um dos seus pontos sólidos. Ele consegue mesclar um mundo interessante e inovações tecnológicas bizarras ao lado de personagens verossímeis e coerentes. A gente se apega a eles, mesmo a um hedonista como o Luo Ji. A ponto de torcermos para cada um deles. Por exemplo, temos Chang Beihai, um soldado condecorado que se rebela em relação ao derrotismo apresentado pelas suas tropas e seus superiores. Então, ele decide agir com base em suas convicções. Beihai é um cara que ama a nação pela qual luta porque existe um apego a tudo o que os seus antepassados fizeram. Algumas de suas decisões são drásticas e reprováveis, mas dentro daquele cenário, ele era a solução final. E vamos ver lá na frente o que os seus esforços irão engendrar. Até achei que fosse haver um algo mais, mas a Batalha da Escuridão é de partir o coração.
E realmente, se formos refletir um pouco, aquilo que se sucede durante esse momento crítico é natural. Nós não fazemos ideia de o quanto somos insignificantes para o universo. Por sermos dotados de racionalidade e sermos a espécie dominante neste planeta, não conseguimos conceber que talvez sejamos um pequeno grão em um enorme deserto. Possivelmente nem um grão de areia; um átomo no grande concerto universal. O que Luo Ji coloca mais tarde a respeito do real significado de floresta sombria é de deixar qualquer um de cabelo em pé. É jogar a realidade na cara e te esbofetear repetidas vezes. Totalmente possível como filosofia cósmica.
Alguns vão achar a solução encontrada pelo autor como boba e água com açúcar. Discordo. Totalmente. Se formos parar para pensar a humanidade tem o hábito de pensar no mais forte primeiro como um inimigo. Raramente a gente para para imaginar de que maneira podemos cooperar com o próximo. Todas as reações durante estes dois volumes primeiro foi a de demonstrar poder, e depois compreensão. Tá, eu não imaginei que a chave de tudo estaria em algo simples, mas a maneira bela como Liu nos encaminha rumo àquela resposta no final é muito coerente. Okay, aquele momento final ao lado de uma formiga poderia ter sido feito há mais tempo, mas a verdade é que o autor deu toda uma dramaticidade àquele momento o que fez crescer em gravitas tudo o que se sucedeu depois. No fundo, A Floresta Sombria é uma história de amor e em como isso consegue alterar toda a realidade como nós a percebemos. O amor é capaz de realizar coisas impossíveis. Se podemos falar em algo que fortalece a humanidade mesmo nos momentos mais sombrios é como nosso coração bate pela nossa outra metade. É em o quanto ela é capaz de despertar todo o nosso potencial. Luo Ji foi movido pelo seu amor a Zhuang Yan e Xia Xia por toda a narrativa. Seja ao encontrar Yan Yan, seja ao perdê-las... foi a mola propulsora para que ele despertasse o que havia de melhor dentro de si.
Se formos encarar por outro lado, Keiko fez o que fez justamente por amor (ou seria rejeição?). O amor é capaz de coisas impossíveis... Pensemos isso para o mal também. Keiko sentia seu coração partido diante de um Hines que a tudo precisava pôr nos ombros. Seu papel como alguém que ama foi o de tentar tirar esse peso, mas ela percebeu que isso não seria mais possível. Já Rey Diaz amava absurdamente o seu povo. Seus pensamentos eram dedicados a eles o tempo inteiro. O amor por um coletivo, por uma cultura, um modo de viver. Mesmo sendo obrigado a agir como uma Barreira e pensar globalmente, ele manteve o espírito de alguém saído da América do Sul. Tudo o que ele desejava era estar junto daqueles que amava. O que acontece a ele na metade da narrativa é de uma tristeza e frustração que são profundas. Compreensível do ponto de vista de quem se sentiu traído, é claro. Já Tyler é o cara que usa o exato oposto de todos: o ódio. Disparar o ódio contra aqueles que ameaçam a Terra. E sua jornada para descobrir como manusear esse ódio vai se tornando frustrante a cada nova tentativa fracassada. Quando ele segue até o Afeganistão e tem aquele encontro com o sábio da montanha (uma verdadeira surpresa quando se imagina quem é) e percebe que nem os extremismos seriam capazes de fornecer a força que ele precisa é aí que ele cai na tristeza profunda. Luo Ji acaba servindo como confessor de todos. E Luo Ji é quem terá a forma mais verdadeira de amor.
Apesar de ser uma ficção científica mais hard do que o volume anterior, A Floresta Sombria é de uma simplicidade e sutileza que somente alguém que se inspirou em Asimov poderia conceder aos leitores. Nada é complexo demais, apesar dos altos conceitos que ele emprega. A gente é capaz de acompanhar a história numa boa apesar da lentidão com a qual a narrativa passa. Talvez a minha crítica esteja mais no fato de ele ser um segundo volume e demorar muito com os preparativos de tudo. A gente percebe lá pela metade da narrativa que esse é um volume de transição entre o começo da proposta do autor e aonde ele deseja chegar. Porém, isso não tira o brilho deste segundo volume que termina em um cliffhanger emocionante.
Ficha Técnica:
Nome: A Floresta Sombria Autor: Cixin Liu Série: O Problema dos Três Corpos vol. 2 Editora: Suma (no Brasil) Gênero: Ficção Científica Tradutor: Leonardo Alves Número de Páginas: 472 Ano de Publicação: 2017
Outros Volumes:
O Fim do Mundo (vol. 3)
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Era a crítica que eu estava precisando. Achei a leitura muito mais redundante e até tediosa que O Problema de 3 corpos, mas sua crítica me deu um segundo ponto de vista. Agradeço, lerei com mais amor agora.