O pistoleiro é um homem marcado pelo passado. Ele chega à cidade em busca de vingança. Uma história que se desdobra por décadas terá seu fim em um duelo mortal. Quem sobreviverá no final?
Sinopse:
Um caçador de recompensas chega numa cidade abandonada em busca de justiça. Mas, para conseguir o que quer, ele precisará enfrentar muito mais do que o homem que procura... Terá que exorcizar fantasmas do passado.
Normalmente nos deparamos com as famosas histórias que cobrem a jornada do herói. Aquele menino da vila que tem o chamado do dever e vai amadurecendo ao longo de sua aventura. Mas, o que pode dar errado no processo? Como tirar um herói do caminho do bem? Como levar alguém à perdição absoluta. Carlos Estefan nos leva em uma jornada terrível de um homem cujo destino acaba se tornando maléfico por conta das suas escolhas.
Durante a minha adolescência eu costumava ler as histórias de Tex Willer. Adorava aquele clima maneiro de velho oeste e em como Tex e seus aliados se livravam de bandidos terríveis como Mefisto e suas maquinações diabólicas. O engraçado é que eu não migrei para os filmes de western, permanecendo apenas nas histórias em quadrinhos. Mas, à medida em que eu fui crescendo, precisei abandonar estas histórias em prol de estudos e trabalho. Nunca mais retornei ao mundo pistoleiro de Tex. Quando vi o trabalho de Carlos Estefan e Pedro Mauro sendo apresentado na CCXP 2017 eu sabia que precisava conferir aquilo. O traço do Pedro Mauro lembra demais o traço das histórias de Tex publicadas pela Bonelli. Fora que o tema não é muito explorado aqui no Brasil, o que é uma pena. Tudo bem que a história criada pelo Carlos Estefan tem muito mais de faroeste americano, mas dava para criar excelentes histórias usando o agreste brasileiro. Sinto que esse é um filão que poderia render ótimas histórias.
O roteiro é muito bom. Explora os meandros do que significa a vingança e como um homem pode desviar completamente de seu caminho. Para conseguir contar sua história, o autor usa e abusa dos flashbacks de uma maneira ímpar. Acho que vi poucas vezes um roteiro conseguir tirar tanto de uma ferramenta como essa. Esta é uma daquelas histórias que você vai precisar ler umas duas ou três vezes para pegar detalhes que você perdeu antes. Isso porque determinados detalhes só ficam compreensíveis depois. E o leitor vai se ver entendendo como determinadas cenas ajudaram a compor a versão final dos personagens.
A arte do Pedro Mauro é cinematográfica. Parece que estamos assistindo um filme onde várias câmeras nos mostram diferentes momentos de uma cena. A gente quase consegue imaginar de fato cada situação: o mocinho escondido atrás de uma mesa de balcão, o suor caindo do rosto de um dos capangas, o bandido dando a volta e armando uma emboscada. As cenas de ação são de tirar o fôlego. Como eu disse: é possível imaginá-las acontecendo de verdade. A arte é linda, seja quando ele foca em um personagem, seja quando ele foca em um horizonte repleto da paisagem do velho oeste. Os personagens são muito expressivos e cada um deles tem marcas individuais que os diferenciam. Algumas são coisas ditas no roteiro como o hábito de piscar o olho do Escocês enquanto outras são observáveis como as roupas dos bandoleiros. Outro ponto alto da arte é em como ela ajuda a narrativa: como os personagens são muito expressivos, Estefan não precisa ficar dizendo que um personagem está enfurecido ou surpreso; basta ver em suas expressões.
A decadência do Escocês é uma jornada inacreditável. Ele começa sendo um homem que busca a justiça para no final corrompê-la completamente. Chega a doer o quanto essa jornada afeta o homem e aqueles ao seu redor. Seus valores vão desaparecendo um a um até sobrar apenas uma sombra daquilo que ele foi um dia. Ao ter sua família atacada por bandidos, o Escocês deseja apenas levar o criminoso que lhe fez mal à justiça. Mas o mundo acaba não sendo bom para ele, e nosso personagem toma as decisões erradas. Somos pessoas formadas pela soma de nossas escolhas. Elas podem nos levar a um ou outro caminho, dependendo apenas de nós mesmos.
A forma como as frustrações do personagem se transformam em violência também é um efeito colateral bem trabalhado. É como se ele estivesse perdendo o controle sobre si mesmo e a simples visão do que restou daquilo que foi cometido à sua família acendesse um barril de pólvora. E suas explosões vão criando uma nova personalidade dentro dele. Algo completamente oposto ao que ele era inicialmente e que vai minando pouco a pouco seus valores. No final da jornada, o Escocês está irreconhecível. A própria família é afetada por essa mudança. Mesmo eles tendo sobrevivido ao brutal ataque dos bandidos, as consequências acabam sendo desastrosas.
Gatilho é uma HQ acima da média. Disso eu não tenho dúvidas. O que a dupla Carlos Estefan e Pedro Mauro fez aqui é certamente algo a ser lembrado. Tenho certeza de que daqui a alguns anos iremos colocar a trilogia (porque Gatilho é o primeiro volume de uma trilogia) como um dos clássicos dos quadrinhos nacionais.
Ficha Técnica:
Nome: Gatilho Autor: Carlos Estefan Artista: Pedro Mauro Editora: Auto-Publicado Gênero: Western Número de Páginas: 68 Ano de Publicação: 2017
Outros Volumes:
Redenção (volume 3)
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