Mary Ann Woodhouse é uma mulher à frente do seu tempo. Ela descobriu um dente de uma criatura que ela chamou de iguanodonte, mas teve sua descoberta roubada por seu marido. É então que ela decide abandonar sua vida tediosa em Londres para seguir atrás do professor Challenger, um homem que pode lhe ajudar a realizar seus sonhos.
Sinopse:
A Era Vitoriana! Uma época de máquinas maravilhosas, prodígios sem fim e mulheres intrépidas!
Mary Ann Woodhouse resolve abandonar o marido após ele roubar a sua descoberta de um dente de dinossauro. Disposta a provar-se para si mesma, ela segue até Londres em busca de uma oportunidade e embarca no Barracuda em direção à Amazônia. Sua missão: procurar a expedição desaparecida do Professor Challenger.
Viaje de Londres até Manaus e embarque para os recônditos mais inóspitos da floresta, seguindo a trilha de Mary Ann até o Inferno Verde. Pilote o dirigível experimental de Santos Dumont e enfrente a ira de um empresário inescrupuloso e seus assassinos. Sobreviva aos perigos de uma caverna misteriosa e maravilhe-se com os segredos da floresta virgem.
Pois esse é o mundo de Vitorianas, Um Século de Aventuras.
Se você está procurando aquele livro puramente de aventura, A.Z. Cordenonsi é o autor certo para você. Todos os livros que ele entregou para nós, leitores, até hoje possuem uma narrativa divertida, bons personagens e uma trama tranquila de se acompanhar. O gênero de aventura costuma ser bastante negligenciado não só aqui no Brasil, mas mundo afora. E eu gosto muito que o Cordenonsi é um expert nele. Torna os seus livros ótimas portas de entrada para todo tipo de leitor, do mais jovem ao mais velho. Folgo em dizer que o Cordenonsi é um autor que eu sempre coloco em listas de indicações para primeiras leituras. Nesse seu mais novo trabalho, ele conseguiu entregar um trabalho redondinho, não só na trama, quanto nos personagens e até no tamanho da narrativa. Mesmo que você tente passar um tempo buscando problemas, não vai encontrar. Gosto da série do Sherlock e os Aventureiros e até do Le Chevalier, mas achei essa história perfeita em todos os aspectos. Vou te contar os motivos.
Na narrativa, acompanhamos a excêntrica Mary Ann Woodhouse que, definitivamente, não é uma dama de seu tempo. Sendo interessada por exploração, ele encontrou os dentes de uma fera nunca antes catalogada, ao qual ela chamou de iguanodonte. Seu marido a traiu, roubando os louros da descoberta para si o que provocou nela uma vontade de tomar as rédeas de sua própria vida. Desejando encontrar pistas de seus "lagartos terríveis", ela descobre informações sobre o professor Challenger, um impetuoso cientista que estaria na Amazônia em busca de ossadas de animais gigantes. Para chegar a Challenger, ela precisa entrar para a tripulação do capitão Roxton e, é claro, ele não aceitará uma mulher como tripulante. Aliás, se a própria Inglaterra não aceita suas mulheres em posições de mais destaque, o que dirá uma mulher que deseja sujar seus pés na lama amazônica para fazer descobertas científicas. Mas, nenhuma dessas coisas irá desencorajar a senhora... digo senhorita agora, Woodhouse.
Esse é um daqueles livros que passam voando pelo leitor. Uma vez que se pega para ler, a gente não consegue parar mais devido a um ritmo frenético com o qual a história é contada. A narrativa segue em terceira pessoas com capítulos bem dosados em tamanho e dramaticidade. Nosso ponto de vista fica sempre em Mary Ann e vivenciamos com ela as aventuras, embora tenhamos um pouco mais de informações do que ela. Cordenonsi divide a trama em três atos, bem delimitados e que servem de um ótimo guia para o leitor. No aspecto da escrita, a narrativa é bastante tranquila de ser entendida. Curioso é que o autor não sobrecarrega nas informações, e isso ele precisando contextualizar a época. A experiência do autor com o gênero de histórias conta muito nessa hora porque ele sabe como e quando fazer. Embora tenha menos de duzentas páginas, a narrativa tem o tamanho ideal para o seu desenvolvimento. Nem mais, nem menos. Não tem enrolação e nem nada foi cortado.
A narrativa é claramente inspirada na obra Mundo Perdido, de Sir Arthur Conan Doyle só que Cordenonsi dá a sua própria assinatura ao livro e o atualiza aos nossos dias. Isso porque ele emprega uma personagem feminina com todos os problemas que ela vivia em sua época. A opção pelo gênero de aventura empregando raríssimos elementos fantásticos foi ótima para o que ele pretendia fazer. Um dos grandes chamarizes na obra de Conan Doyle eram os personagens explorando lugares exóticos e descobrindo lugares e situações inesperados. Sou um fã de Mundo Perdido e de outras histórias nessa pegada exploratória e posso dizer o quanto me diverti lendo essa história. O que mais me surpreendeu foi o fator diversão que, às vezes, é deixado de lado pelos autores em prol de uma história mais reflexiva ou dramática. Nada contra, mas em alguns momentos só desejo fugir da minha realidade por alguns momentos e somente curtir uma doce aventura com os meus personagens. Histórias de aventura possuem essa característica de nos permitir essa fuga. A narrativa de Cordenonsi é simples, mas não no sentido pejorativo, e sim em como ele consegue trazer o leitor para junto dele e o levar pela mão a um outro mundo.
Ainda assim ele consegue tocar em dois grandes temas, sendo um deles a do preconceito de gênero. Estávamos em pleno século XIX, com a Segunda Revolução Industrial batendo à porta e as pessoas buscando um mundo mais iluminado e desenvolvido. No entanto, a mulher continuava relegada às suas funções ancestrais: cuidar da casa e dos filhos. Só que o século XIX é o momento em que mulheres fortes como Mary Shelley passam a se interessar por ciências, incomodando a sociedade patriarcal da época. Mary Ann é uma mulher ousada, acostumada a ouvir as reprovações masculinas, mas que decidiu ignorar estes comentários tolos que em nada contribuiriam para o que ela desejava. A personagem é apresentada em suas qualidades e defeitos e mostra quantos obstáculos ela precisa superar. É legal perceber que a base desta história se encontra na necessidade que ela tem de provar o seu valor para Roxton e Challenger. Para quem acha que Cordenonsi foi exagerado ao colocar uma sociedade tão reticente, está redondamente enganado. Era até pior. Uma mulher como Mary Ann seria trancada por seu marido ou até considerada louca e sedada.
A história tem também ótimos personagens de apoio e Cordenonsi mescla um pouco com a história do Brasil. É óbvio que ele vai tomar algumas liberdades criativas, mas ter inserido Santos Dumont no grupo de Mary Ann foi bem legal. Deu aquele sabor brasileiro que a história precisava. Os personagens possuem suas personalidades bem trabalhadas mesmo com a história sendo curtinha. Seja Roxton e sua característica teimosa e intrépida, ou Challenger com seu jeito pedante ou Dumont com medo dos perigos, mas sendo alguém brilhante em seus inventos. A dose certa para cada personagem. Os diálogos são excelentes e respeitam bem o espírito da época. Como disse acima, Cordenonsi precisa explicar algumas coisas sobre a época em que a história se passa e detalhes sobre pesquisas arqueológicas (até inserindo personagens reais como Howard Carter e Champollion), mas nunca deixa a história ter barrigas. As trocas de farpas de Mary Ann com os personagens masculinos são divertidíssimos e dá um tom de leveza à história.
A palavra-chave para esta história é equilíbrio. O autor encontrou a quantidade ideal de diversão, aventura e reflexão sobre o papel da mulher na sociedade vitoriana em um livro delicioso de ser lido. Ótimo para uma tarde de sábado. Já vi que Cordenonsi se propôs a fazer uma série com diversas histórias fechadas, algo no qual ele é mestre em fazer. Experiência conta muito nessa hora. Por enquanto o livro está somente disponível em formato digital, mas está tão baratinho e vale tão a pena que não tem como não recomendar. Podem conferir numa boa. Para mim, é nota máxima.
Ficha Técnica:
Nome: O Dente do Iguanodonte
Autor: A.Z. Cordenonsi
Série: Vitorianas - Um Século de Aventuras vol. 1
Editora: Autopublicado
Número de Páginas: 160
Ano de Publicação: 2023
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*Material recebido em parceria com o autor
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