Um grupo de pessoas desconhecidas precisa aprender a lidar com as diferenças para superar os obstáculos de uma nova realidade.
Sinopse:
O que você faria se acordasse em um lugar completamente estranho, com sete pessoas estranhas e descobrisse que já não está em sua cidade, sua cama, sua realidade? E se, além disso, o local onde estivessem fosse incendiado e uma das garotas simplesmente não acordasse?
Que decisões tomar? Que caminhos seguir? Fugir ou lutar?
Atravesse o portal com os aventureiros e descubra o seu caminho...
O Enigma da Adormecida
Viver uma aventura pode ser mais complicado do que nossa imaginação nos leva a crer. Castelos, bosques, reis e rainhas, seres encantados e lutas de espadas escondem uma realidade dura e cheia de provações até mesmo para os mais experientes, e esse definitivamente não é o caso do grupo de pessoas que aparece no Reino do Portal.
Oito pessoas sem nenhum vínculo simplesmente aparecem em um celeiro trancado e logo precisam escapar, mas apenas sete estão despertas. Essa introdução já prepara o leitor para se familiarizar com o território - medieval, pequeno, limitado e perigoso - e com as personagens. Tudo parte deste ponto; pouco a pouco, percebemos mudanças na escala: do celeiro para o castelo, do castelo para o bosque, mas toda a ambientação é pequena e simplificada.
Uma questão, no entanto, se faz mais urgente de ser explorada, antes de entrarmos nos aspectos da história: a Adormecida. Naturalmente, a autora utilizou referências bastante clássicas na composição do livro, desde elementos de RPG de mesa até os contos de fadas, e buscou inspiração justamente em A Bela Adormecida, num misto de Disney e Irmãos Grimm. Particularmente, não tenho nada contra a repaginação de contos de fadas, inclusive gosto de alguns, mas este em específico pode ser problemático.
Existem algumas questões em torno da Bela Adormecida que causam grande desconforto quando analisamos a história no mundo atual, e as principais delas são a fragilidade feminina e a cultura do estupro. Em releituras contemporâneas, há um grande esforço em afastar tais implicações, como em Maléfica, por exemplo. Caso você não esteja familiarizado com a problemática levantada, romantizar uma princesa impotente, indefesa e eternamente bela que só poderá ser acordada por um beijo - não consentido - reflete a objetificação da mulher e a noção de que ela precisa ser salva. A situação é bem mais complexa, mas precisamos voltar à análise do livro.
Pois bem, a autora optou por seguir à risca a visão clássica de Bela Adormecida e acrescentou mais alguns pontos bastante questionáveis: toda a situação em que Bela se encontra é sexualizada e, em alguns momentos, até mesmo obscena, e quando eu falo de obscenidade eu me refiro a algo absolutamente reprovável. Como leitora, o sentimento de desconforto diante dessa abordagem quase me fez largar a leitura. As mulheres não deveriam continuar a ser retratadas assim em histórias contemporâneas.
Ultrapassado esse - grande - entrave, a ambientação do Reino do Portal é muito boa, ainda que largamente amparada em cenários já bastante explorados na fantasia. A descrição se ancora em aplicar realismo à situações bastante corriqueiras em narrativas fantásticas, como os desafios de se viver em um castelo medieval e a dificuldade em manejar arcos e espadas. A autora conseguiu utilizar muito bem a própria limitação do mundo para torná-lo palpável e interessante.
Os problemas voltam a aparecer nas personagens, e eu já não vou mais citar a Bela aqui, abusando de clichês cansativos, como a mocinha chorona, o valentão, o líder nato cheio de sex appeal e a "feminista" histérica. Novamente, fico preocupada com a visão deturpada que essas personagens transmitem.
A história busca refletir uma moral forte de cooperação e espírito de equipe, de coletivo e de superação. O ritmo narrativo é muito bom e está sempre em movimento, movendo as personagens nas direções necessárias, seja para a sobrevivência imediata ou para a pretendida evolução. Nem todas as personagens evoluem, ainda que se tente passar esta imagem, mas a narrativa sim, e esse é um ponto muito favorável. Entretanto, a escrita não me convenceu devido ao abuso de jargões e descritores repetitivos.
Evocando os mais tradicionais RPGs, Simone O. Marques mistura elementos de aventura role-play, mitologias e contos de fadas. O Enigma da Adormecida, no entanto, tropeça nas próprias escolhas narrativas e perde a oportunidade de apresentar uma história menos datada. Ao fugir de uma atualização necessária, mais complexa e mais interessante, fica preso em velhos conceitos e preconceitos e em uma contação da histórias já vencida. É uma pena, já que existe uma qualidade perceptível no livro, ainda que mal aproveitada.
Ficha Técnica:
Nome: O Enigma da Adormecida
Autora: Simone O. Marques
Série: Crônicas do Reino do Portal vol. 1
Editora: Avec
número de Páginas: 312
Ano de lançamento: 2017
Link de compra:
Este livro foi cedido em parceria com a Editora Avec.
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