Em um mundo alternativo onde a França dominou os ares, a expansão napoleônica formou a Hegemonia: um coalizão de países que usa a tecnologia da aviação a serviço da conquista. E um de seus principais precursores será Alberto Santos-Dumont.
Sinopse:
Noveleta do organizador de Vaporpunk, Dieselpunk e o maior autor de história alternativa do Brasil. Os norte-americanos até hoje insistem que os Irmãos Wright foram os grandes pioneiros da aviação... Imagine um mundo em que, no início do século XX, a Europa permanece unificada sob a hegemonia da França Napoleônica. Um mundo em que Napoleão I derrotou a Royal Navy com uma esquadra de navios a vapor. Um mundo em que, quando os Wright vão exibir seu novo invento ao napoleão da Hegemonia Europeia, sofrem uma grande surpresa...
Começo esta resenha pelo final dela. Já aviso aos leitores que eu não gostei do conto. Não gostei fortemente dele. Aviso isso porque esta vai ser uma daquelas resenhas em que vou resmungar igual a uma velha rabugenta por vários parágrafos a fio. Fico triste porque gosto demais do autor; é uma pessoa que eu conheço pessoalmente e admiro o trabalho e sei o quanto ele é capaz de escrever melhor do que o que foi apresentado aqui. Mas, preciso vestir o meu capuz de resenhista e passar ao meu leitor as minhas impressões. Então também peço desculpas ao Gerson, mas preciso tecer meus comentários sobre o que li.
Vou começar pelo positivo para depois partir para o negativo. Entendi aonde o Gerson queria chegar. A ideia é um tratado sobre como, mesmo com a melhor das intenções, a ciência pode ser usada para fins bélicos. Oppenheimer e Einstein estão aí para comprovar a minha fala. Tanto que a própria narrativa do autor muda o tom conforme ela vai progredindo. No começo temos uma narrativa brilhante com uma Paris iluminada e um imperador francês alegre recebendo os irmãos Wright para uma demonstração de um jovem brasileiro inventor. Mais para o final as campanhas de guerra vão tornando tudo mais destrutivo e sombrio. Isso pode ser percebido nas descrições feitas pelo autor. A França do final do conto está cansada e deseja apenas acabar com tudo. Quando acontece a virada narrativa lá no final é a demonstração cabal de que o mundo virou de ponta a cabeça.
A narrativa do autor é uma história alternativa. Ele mudou um leve detalhe e transformou toda a estrutura geopolítica global. Não sou o fã mais ardoroso deste subgênero, pelo menos não em sua conformação clássica seguindo a linha de autores como Harry Turtledove que adoram brincar com a ideia do "E se...". Isso porque a maior parte dos autores que optam por essa linha ou são historiadores de formação ou gostam do debate político-econômico em sua conjuntura histórica. Isso faz com que as histórias pendam para um lado mais descritivo da coisa. Por eu ser um historiador social, prefiro mais compreender estruturas e hábitos, refletir sobre a sociedade como um todo, como uma manifestação cultural afeta um determinado grupo. Philip K. Dick consegue usar bem o subgênero da história alternativa em O Homem do Castelo Alto. A narrativa de O País da Aviação é enciclopédica em vários momentos. Se podemos dizer que temos um protagonista seria a própria França. Então temos páginas e mais páginas descrevendo ações políticas e militares e acontecimentos que se sucedem um após o outro. Esses acontecimentos seriam interessantes se eles tivessem alguma consequência, mas o leitor não tem tempo de processar a informação. Logo em seguida acontece mais alguma coisa. É como se eu estivesse lendo um livro de História.
Um segundo problema grave é a total ausência de personagens femininas. Não tem. Zero. Nenhuma. Nem a Maria, nem a Joaquina, nem a tia do pão. Ninguém. Isso me remonta ao que havia de pior na escrita do Isaac Asimov na chamada Era de Ouro em que ele fazia o mesmo. País da Aviação foi publicado em 2012; não pode ter um erro crasso desses. Mesmo que fosse uma personagem em papel secundário na história, não ter é um pecado. Acho que nem vou me alongar nisso porque meu argumento é curto e simples.
Ao abdicar de um protagonista claro, há também uma despersonalização da narrativa. Podemos entender que Santos Dumont ou os Napoleões são uma espécie de protagonistas tênues. Mas, não é dado nenhum desenvolvimento a eles ao longo da narrativa. Então, vou entender que a própria França é a protagonista de sua própria história, como Asimov fez em Fundação. Para ter o efeito que o Império Galáctico teve nas mentes dos leitores, Asimov precisou de três livros. É impraticável fazer o mesmo em pouco mais de cinquenta páginas. Era preciso ter escolhido um protagonista, por mais que ele fosse um personagem-orelha. Por mais que ele estivesse ali apenas para observar a história. A consequência disso é uma narrativa impessoal e que não cria vínculos com o leitor.
Enfim, sinto dizer que eu não recomendo a leitura desse conto. O ritmo também é arrastado demais; chega um momento em que eu quase abandonei a leitura, mas consegui levar até o final. Sei das potencialidades do autor e ele já provou isso diversas vezes em novellas e romances como Octopusgarden. Esse conto aqui deixou muito a desejar. Ou talvez eu deva abandonar em definitivo o gênero de história alternativa porque ultimamente eu não tenho encontrado histórias que me agradem. Acho que poucas vezes eu saí irritado de uma leitura como eu saí dessa. Só não confiro uma nota menor por conta da temática que eu acho sempre válida de questionar a indústria bélica e a ciência sendo usada para a destruição e o fato de o conto ser bem escrito. No mais, é uma sucessão de problemas. Ah... até esqueci de comentar. O conto se passa em um cenário steampunk.
Ficha Técnica:
Nome: País da Aviação
Autor: Gerson Lodi-Ribeiro
Editora: Draco
Número de Páginas: 58
Ano de Publicação: 2012
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