Em um universo onde homens comuns possuem interesses não tão heroicos, Abercrombie nos apresenta a história de três personagens que buscam redenção acima de tudo. Mas, no caminho desta redenção, muito sangue será derramado.
Sinopse:
Sand dan Glokta é um carrasco implacável a serviço da Inquisição de Sua Majestade. Nas mãos dele, os supostos traidores da Coroa admitem crimes, apontam comparsas e assinam confissões – sejam eles culpados ou não. Por ironia, Glokta é um ex-prisioneiro de guerra que passou dois anos sob tortura. Mas isso nunca teria acontecido se dependesse de Logen Nove Dedos. Ele jamais deixaria um inimigo viver tanto tempo. Só que isso foi antes. Agora ele está decidido a mudar. Não quer ser lembrado apenas por seus feitos cruéis e pelos muitos inimigos que se alegrarão com sua morte. Já a felicidade do jovem e mulherengo Jezal dan Luthar seria alcançar fama e glória vencendo o Campeonato de esgrima, para depois ser recompensado com um alto cargo no governo que lhe permitisse jamais ter um dia de trabalho pesado na vida. Mas há uma guerra iminente e ele pode ser convocado a qualquer momento. Luthar sabe que, nos campos do Norte gelado, o embate segue regras muito menos civilizadas que as do esporte. Enquanto a União mobiliza seus exércitos para combater os inimigos externos, internamente se formam conspirações sanguinárias e um homem se apresenta como o lendário Bayaz, o Primeiro dos Magos, retornando do exílio depois de séculos. Quem quer que ele seja, sua presença tornará as vidas de Glokta, Jezal e Logen muito mais difíceis. Agora a linha que separa o herói do vilão pode ficar tênue demais.
Quando lemos um romance de fantasia costumamos buscar os heróis. Saber quem é a pessoa que vai salvar o dia. Geralmente um protagonista de uma história de fantasia é uma pessoa buscando salvar inocentes, trazer a justiça ou salvar aquela princesa de contos de fadas. Na Trilogia do Espinho, Mark Lawrence nos apresenta um personagem detestável, mas carismático que se torna o protagonista de uma longa sequência de atos de pura violência. Jorg Ancrath é um bastardo miserável, mas um cara que aprendemos a respeitar. Porém, Jorg beira ao exagero às vezes. Joe Abercrombie nos apresenta personagens reais: com qualidades, defeitos e características únicas em sua individualidade. Alguns críticos dizem que os personagens são anti-herois ou até antagônicos. Não penso assim. A maior virtude na escrita de Abercrombie é ter nos apresentado a realidade.
Na review desse primeiro livro gostaria de me focar apenas de três personagens: Logen Nove Dedos, Jezal Dan Luthar e Sand dan Glokta. Alguns podem me criticar por eu não falar um pouco sobre o mago Bayaz, ou o major West ou até sobre Ferro Maljinn, mas a verdade é que o primeiro livro trata mais da apresentação destes três.
"Apenas um instante atrás, não parecia possível que a situação piorasse, mas o destino dera um jeito de isso acontecer. Logen duvidava que Quai fosse de muita utilidade numa luta. Isso o deixava sozinho contra três ou mais, e tendo apenas uma faca. Se não fizesse nada, Malacus e ele seriam roubados e, mais do que provavelmente, mortos. É preciso ser realista com essas coisas"
Logen Nove Dedos é um personagem com uma aura mais introvertida. Em seus capítulos, o autor usa de uma descrição maior do que ele observa, sua mentalidade é bem simplória. Apesar disso, não devemos entender Logen como alguém fácil de ser decifrado. Ao longo deste primeiro livro, Abercrombie vai lentamente nos apresentando as camadas que formam este complexo personagem, como se ele estivesse descascando uma cebola. Quando acontecem alguns fatos mais para o final deste primeiro volume vamos ver que o personagem guarda uma profunda amargura dentro de si. E isto pode explodir raivosamente e ocasionar sérios problemas para ele.
Ao mesmo tempo, Logen ressente a falta do seu grupo. Ao longo da trama, é possível observar todo o respeito que Harding Sinistro, Tul Duru, Barca Negra, Rudd Três Árvores e Cachorrão nutrem pelo seu líder. E como Logen complementa esse grupo de guerreiros. Ao mesmo tempo Logen é um ser amargurado com o passado vivido junto com o seu grupo. O tempo em que ele passou com Bethod, rei dos nórdicos, parece tê-lo marcado profundamente. A presença de Bethod neste primeiro livro ainda é muito pequena, mais como uma ameaça do que como algo real e palpável. Mas já é possível observar como o autor valoriza a relação entre Logen e Bethod.
Jezal dan Luthar é o tipo de homem que nunca teve que lutar por nada para se dar bem na vida. No início do livro ele descreve bem como são os seus dias: roubando dinheiro em apostas, treinando com o lorde marechal Varuz para um torneio que ele não sabe para que serve e paquerando mulheres. Mas, lentamente o enredo vai apresentando empecilhos e complicando sua vida: a aparição de Ardee, o desafio do Temível e o surgimento de Bayaz. Jezal se vê impossibilitado de continuar vivendo sua vidinha mansa e fácil. Ele será obrigado a tomar posturas que ele não teria normalmente. Se a gente pode falar em algum personagem realizando a jornada do herói, esse alguém é o Jezal. Neste livro, Abercrombie joga direto na nossa cara como este sujeito é desprezível. Ao final do primeiro livro duvido que existam muitos que falem bem das ações de Jezal.
“As pessoas daqui nasceram em suas castas. Eles têm plebeus para lutar, cultivar a terra e trabalhar. Têm a burguesia para comerciar, construir e pensar. Têm a nobreza para possuir a terra e dar ordens aos outros. Têm a realeza... esqueci exatamente para quê.”
Dos três personagens de Abercrombie, para mim, Glokta é o mais interessante. Ele é um herói-vilão. Sendo um inquisidor, sua missão é torturar as pessoas em troca de informações suficientes para que o arquileitor Sult possa mover prisões e exílios. Glokta foi um Jezal no passado, mas a guerra fez com que ele se tornasse um modicum do que já foi no passado. Glokta enxerga a vida em tons de cinza e sabe que é preciso jogar o jogo para continuar vivo. Seus braços de espadachim foram substituídos por dois práticos (seus auxiliares): Severard, que possui um jeito irônico e risonho ao mesmo tempo em que sabe pensar esquemas que facilitem a vida de Glokta e Frost, um albino imenso e extremamente violento que serve como o torturador de Glokta. Neste primeiro livro Glokta é mostrado em toda a sua crueldade, mas acabamos nos apegando a ele por tudo o que lhe foi feito no passado. O leitor acaba sempre encontrando desculpas pelo comportamento dele.
Apesar de estarem em lugares diferentes, todos os três personagens acabam sendo atraídos de uma forma ou de outra para a cidade de Adua (salvo Jezal que é um capitão da guarda da cidade). Somos deixados com mais perguntas do que respostas, mas a cidade é muito bem descrita pelo autor. Acho até que Abercrombie não gastou muito tempo sendo descritivo e preferiu se concentrar em seus personagens. Ele deu personalidade e individualidade a cada um deles. Isso os tornou muito complexos e carismáticos.
O Poder da Espada é uma longa introdução a uma trilogia. Existem alguns que acreditam que A Primeira Lei é um livro só dividido em vários atos. Não deixo de cogitar essa possibilidade que é bem real. Sei que eu recomendo muito este livro que, apesar de não ter tanta ação, apresenta uma história que parece ser bem fascinante. Algo que ele vai trabalhar melhor nos outros dois livros.
“Ah, que vida dura. Capanga e torturador é um verdadeiro avanço para você, não? Todo homem tem suas desculpas e, quanto mais vil o homem se torna, mais tocante precisa ser a história. Qual será a minha história agora?”
Ficha Técnica:
Nome: O Poder da Espada
Autor: Joe Abercrombie
Série: A Primeira Lei vol. 1
Editora: Arqueiro
Gênero: Fantasia
Tradutor: Alves Calado
Número de Páginas: 480
Ano de Publicação: 2016
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