Quando Rini aparece no Lar de Eleanor procurando por sua mãe, os estudantes sabem que a missão que têm nas mãos é muito mais complexa do que Rini antecipou.
Sinopse
Volume 3 da série Crianças Desajustadas
“ISSO NÃO FAZ O MENOR SENTIDO. O QUE SIGNIFICA QUE PODE FUNCIONAR. VÃO, MEUS QUERIDOS, E TRAGAM SUA IRMÃ PERDIDA E DESPEDAÇADA DE VOLTA PARA CASA.”
Quando Rini aterrissa com um estrondo no lago atrás do Lar de Eleanor West para Crianças Desajustadas, a última coisa que espera descobrir é que sua mãe, Sumi , morreu anos antes que ela fosse concebida. Mas Rini não pode deixar que a Realidade fique no caminho de sua missão – não quando ela precisa salvar um mundo inteiro! (Uma situação muito mais comum do que se imagina.)
E, se não encontrar uma maneira de reconstituir sua mãe, Rini precisará salvar mais que um mundo: ela sequer terá nascido. Em um lugar sem magia, não há muito tempo antes que a Realidade perceba sua existência e a apague. Ainda bem que os estudantes estão bem acostumados com missões…
AVISO: PODE CONTER AMENDOIM
As Crianças Desajustadas
Alerta: Contém spoilers dos livros anteriores.
Quem vem acompanhando a série até aqui já sabe que um dos pontos mais fortes da Seanan McGuire é o desenvolvimento das personagens e suas peculiaridades. Antes de começar a discutir propriamente a história deste terceiro volume, quero lançar luz sobre algumas questões referentes a essas personalidades tão diversificadas que a autora criou e evoluiu desde o início, em De Volta Para Casa.
A esta altura, já se espera que McGuire construa suas personagens em torno de alguma questão de relevância social: além de várias abordagens LGBTQ+. Há uma forte discussão sobre bullying e outras angústias afligindo os jovens, como o valor das aparências e da aceitação do grupo. E assim a autora deu vida a personagens imperfeitos e tão humanos quanto possível, ansiosos, aflitos, envergonhados, mas nem por isso menos corajosos e empáticos. Nancy, Kade, Sumi e as gêmeas Jack e Jill definitivamente são os rostos por trás das páginas. Eles conversam com o leitor de igual para igual, seja remetendo-o a um passado de inseguranças ou, ainda, mostrando a esse leitor que ele não está sozinho em suas próprias particularidades.
Sob o Céu Açucarado introduz duas novas personagens no plot central: Cora e Rini. Ainda que, particularmente, a minha atenção tenha se voltado mais para aqueles que eu já conheço, não posso deixar de admirar quão bem trabalhadas as duas novatas são. Cora é uma jovem ansiosa e insegura, com um histórico traumático de bullying por ser gordinha; Rini é o oposto, despreocupada, elétrica e mandona. Conhecer o background de cada uma delas, pincelado aqui e ali, conferiu uma profundidade impressionante para ambas nas pouco mais de cem páginas da novela.
As personagens seguem ditando o tom da narrativa de McGuire, sobrepondo lógica e nonsense a fim de criar um universo extraordinário de possibilidades e, ainda mais importante, de respeito, empatia e amor ao próximo.
Sob o Céu Açucarado
Um mundo de açúcar, doces, bolos, plantações de milho doce e um mar de refrigerante de morango: esta é a Confeitaria, o lar de Sumi. Ou pelo menos era, já que ela está morta. Recapitulando, Sumi foi assassinada por Jill em De Volta para Casa, primeiro livro da série Crianças Desajustadas (eu avisei que teríamos spoilers!). Tempos depois do desfecho do volume inicial, encontramos o Lar de Eleanor muito parecido com aquele que deixamos para trás. Cora é a nova protagonista, então tudo acontece na perspectiva dela: são as impressões dela sobre a escola, sobre os outros estudantes, sobre Rini e todas as situações que vão ocorrendo durante a trama.
Talvez Cora não tenha sido tão interessante de se seguir quanto Nancy ou Jack foram nos livros anteriores, mas esse novo olhar sobre a situação dos mundos e seus viajantes também é um ponto interessante explorado pela autora. Já falei um pouquinho sobre Cora, mas confesso que gostaria de ter descoberto um pouco mais sobre a menina. Seu lar é um mundo submerso, onde Cora era - ainda é - uma sereia, livre dos obstáculos de seu corpo físico que um mundo normal impõe. Mas, apesar de Cora comandar o ritmo narrativo, a história é de Rini e Sumi.
Com a morte de Sumi no Lar de Eleanor, Rini foi afetada no mundo da Confeitaria; se a mãe morreu antes de concebê-la, Rini não pode mais existir. Nesse ponto, a narrativa parece um pouco confusa pois passado, presente e futuro se misturam num emaranhado de fatos, e é preciso lembrar que a Confeitaria é um mundo nonsense e não segue as regras de lógica aplicáveis aos outros mundos. As coisas não fazem sentido mesmo, e forçar um raciocínio muito concreto seria ir contra a própria natureza de Rini e seu mundo.
Toda a argumentação da autora para trazer Sumi de volta à história é a profecia de que apenas Sumi conseguiria salvar a Confeitaria de uma rainha tirana, profecia essa que não pôde se cumprir por causa da sua morte precoce (ainda recapitulando, a explicação de Sumi sobre ser expulsa da Confeitaria e seu papel político no mundo é dada em De Volta Para Casa). Então se inicia a saga para ajudar Rini e a Confeitaria.
Preciso dizer que mesmo para uma novela, com poucas páginas, achei o início bastante arrastado. Cora e Rini não conseguiram me cativar muito, mas a presença de Kade e Christopher, dois dos meus favoritos, me incentivou a prosseguir na leitura. A ambientação é excelente e a Confeitaria é tão maluca quanto se poderia esperar. Senti uma inspiração no famoso conto João e Maria, onde tudo é comestível e delicioso, e possivelmente em Alice no País das Maravilhas, com toda a bizarrice inexplicável, governado por uma déspota ensandecida. Particularmente, eu dispensaria algumas descrições a mais, mas a verdade é que, considerando o conjunto, a escrita da Seanan funciona muito bem.
Seanan McGuire toca em temas sensíveis em Sob o Céu Açucarado e aprofunda personagens que, a esta altura, já são velhos conhecidos. Kade e Christopher ganharam várias novas camadas e personalidades complexas e trazem reflexões muito pertinentes à trama. A questão dos diferentes mundos também é mais explorada e elaborada, sendo possível compreender com muito mais clareza o funcionamento das portas, das necessidades dos mundos e dos viajantes que vêm e vão entre um mundo e outro. O que se inicia como uma jornada por um universo açucarado revela enorme maturidade e seriedade ao tocar em temáticas fundamentais para a compreensão da série como um todo.
Entre os três livros já publicados aqui no Brasil pela editora Morro Branco (aliás, em um trabalho lindíssimo), Sob o Céu Açucarado é o mais sensível e intimista de todos, sendo necessário entender que, às vezes, é preciso abrir mão da ação e aventura para que se possa refletir e compreender melhor o que está acontecendo.
Ficha Técnica:
Nome: Sob o Céu Açucarado
Autora: Seanan McGuire
Tradução: Cláudia Mello Belhassof
Editora: Morro Branco
Número de Páginas: 192
Ano de Lançamento (no Brasil): 2020
Outros Volumes:
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