Em um mundo onde o caos social impera e as pessoas adquiriram uma doença que os tornou incapaz de falar, Rye tenta sobreviver em mais uma jornada em um ônibus lotado. Mas, um acidente vai fazer com que ela conheça alguém que vai mudar a sua percepção sobre o que acontece ao seu redor.
Sons da Fala é um conto cruel que mostra a selvageria do ser humano e o quanto somos capazes de esquecer nossa humanidade. Nossa protagonista é Rye, uma mulher que está voltando para casa em um ônibus lotado de pessoas. Uma doença afligiu a humanidade e retirou da maior parte das pessoas a capacidade de falar e boa parte do seu raciocínio. Agora, os seres humanos não falam, apenas se comunicam com expressões iradas e com a violência. Quando encontram alguém que sabe falar, a inveja transparece e o indivíduo é espancado. Após um acidente no ônibus em que Rye estava, após uma briga entre duas pessoas que escala para algo generalizado, um homem chega de carro e oferece ajuda para Rye. Será sensato aceitar a ajuda?
Octávia Butler sabe jogar na nossa cara o quanto o ser humano é falho. Seja em uma narrativa sobre o preconceito étnico ainda existente, seja a incapacidade que temos de conviver como uma espécie unida ou até do fanatismo religioso, Butler sabe tocar nas nossas vulnerabilidades. Os seres humanos desse conto são praticamente animalescos seja em seus gestos, seja em sua forma de agir. O mundo parece uma paródia distópica do nosso onde uma simples viagem para obter suprimentos é uma jornada aos recantos mais selvagens do mundo. Se eu puder associar a alguma coisa, me lembrou os primeiros 40 minutos do filme Eu sou a Lenda (até o momento em que ele lida com os vampiros embaixo do viaduto). Por conta de todo esse problema, Rye não é mais capaz de confiar nas pessoas. O interessante é que a única pessoa que sabemos o nome é a protagonista e duas outras personagens que aparecem no final. Mesmo o homem que acaba entrando na história recebe um nome de Rye. Seja o motorista que tem em seu ônibus o seu ganha pão ou a mulher desesperada que foge de seu agressor. A humanidade está desprovida daquilo que a torna única: sua individualidade.
Não há mais instituições funcionando neste mundo. Polícia, governos... o que impera é a sobrevivência do mais forte. O fato de o homem do carro estar portando uma estrela de policial chega a ser curioso. Mas, como Rye vai acreditar que aquele homem representa uma força do bem? Não será apenas uma estratégia para baixar suas defesas e fazer com que ela entre em um novo lugar perigoso? É essa a dúvida que paira até para o leitor já que Butler não nos deixa margem para acreditarmos em algo diferente. Somente a fé da protagonista é que a fará seguir em frente e se arriscar diante do inesperado. Ela terá que confiar em seus instintos. A mensagem poderosa que fica nessa narrativa está no final e somente lá é que você vai entender por que o conto se chama Sons da Fala.
Ler qualquer coisa da autora é uma viagem por uma reflexão que se apodera do leitor. Seja destacando nossos aspectos sombrios, seja nos dando alguma luz de esperança no fim do túnel. Esse é um conto veloz, com uma temática poderosa e que vai fazer você ficar interessado em conhecer outras histórias da autora. Que tal experimentar?
Ficha Técnica:
Nome: Sons da Fala
Autora: Octávia E. Butler
Editora: Morro Branco
Número de Páginas: 35
Ano de Publicação: 2019
Conto disponível gratuitamente em:
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