Akeha e Mokoya são irmãos gêmeos, filhos da Protetora do reino. Mokoya nasceu com um dom especial que a torna uma profetisa. Já Akeha é a criança que restou. Quando ele atinge a fase adulta, ele decide viver sua vida e fazer sua própria história.
Sinopse:
Mokoya e Akeha, as crianças gêmeas do Protetor, foram vendidas para o Grande Monastério como infantes. Enquanto Mokoya desenvolveu o seu estranho dom profético, Akeha foi sempre aquela que poderia ver os fios que movem os adultos a agirem de uma determinada forma. Enquanto Mokoya recebe visões do que pode vir a ser, Akeha percebe o que pode ser. E mais ainda, eles viram a doença no coração do Protetorado de sua mãe.
Uma rebelião está crescendo. Os Maquinistas descobrem novas alavancas que movem o mundo todos os dias, enquanto os Tensores lutam para colocá-los abaixo e preservar o poder do estado. Não querendo continuar a ser um peão nos esquemas deturpados de sua mãe, Akeha deixa o Tensorado para trás e se une aos rebeldes. Mas a cada passo que Akeha dá rumo aos Maquinistas, é um passo longe de Mokoya. Poderá Akeha encontrar a paz sem romper o laço que ela compartilha com o seu irmão gêmeo?
Para comentar sobre este livro, é preciso falar de sua publicação peculiar. The Black Tides of Heaven é uma novella, ou seja, de tamanho mediano lançado em conjunto com sua novella gêmea The Red Threads of Fate. A segunda representa o volume dois da série Tensorate. Sim, meus caros: os volumes 1 e 2 foram lançados ao mesmo tempo. Gostei do experimento, não deve ter sido simples para o autor, apesar de que em entrevista ao Io9 ele comentou que ele havia escrito o volume 2 primeiro e tinha Black Tides com uma ideia bem avançada. Certamente foi uma jogada arriscada, mas achei que no final o resultado foi melhor do que o esperado.
Jy Yang tem uma escrita bem tranquila de seguirmos. O livro é escrito na forma de uma biografia apresentando vários momentos-chave na vida de Akeha, até o reencontro com Mokoya mais velho. Aqui eu tenho que situar o experimento interessante feito pelo autor porque neste mundo as pessoas nascem sem seu sexo definido. A partir de uma certa idade durante a adolescência, a pessoa pode fazer um ritual de confirmação para escolher um gênero específico. Ou não. Nós conhecemos um personagem mais à frente na história que não havia confirmado mesmo estando na faixa dos vinte anos. Trouxe esse elemento de narrativa para mostrar a dificuldade que foi para o autor escrever as ações de Akeha e Mokoya quando eram pequenos, já que ambos não tinham sexo definido. O autor optou pelo uso do pronome "they" (que representa a terceira pessoa do plural) e o emprego da voz passiva em alguns trechos. Nesse sentido, eu acho que a opção usada pela Ann Leckie na série Imperial Radch ficou melhor, mas nesse último caso se tratava de uma A.I. Não sei se dava para aplicar aqui. Essa escolha do autor me lembrou também A Mão Esquerda da Escuridão em que os personagens de Gethen não possuem sexo definido, decidindo-o durante um período do mês. A autora, Ursula Le Guin, optou também pelo emprego da terceira pessoa. Enfim, eu achei a ideia legal, mas senti que o autor não usou esse recurso mais tarde, quando se referia a Yongcheow. Ele confirmou? Ou não? Não entendi... porque em nenhum momento fica explícito se o personagem se submeteu ou não à confirmação.
A narrativa é em terceira pessoa e, por se tratar de uma novella, os capítulos são bem curtos. É uma leitura extremamente veloz e a escrita de Yang facilita demais isso. Não senti qualquer dificuldade e as informações são soltas de maneira bem processual. Vamos nos acostumando pouco a pouco àquilo que nos é apresentado. Nada é forçado, tudo é muito orgânico. Em Black Tides, somos colocados junto de Akeha que é o nosso ponto de vista. Curiosamente, Akeha nem é tão personagem-orelha assim. Ele não fica perguntando "o que" ou "como" ou "por que" toda hora como geralmente acontece quando um autor pretende fazer a construção de mundo. Ele simplesmente sabe e tece ligeiros comentários que nos inserem na narrativa.
O protagonista foge um pouco do clichê do herói. Por ele ser a criança que restou, ele é relegado ao segundo plano e o autor nos faz perceber isso através de pequenos detalhes: o fato de ele sempre estar ao fundo, um eterno observado, suas falas serem sempre curtas e objetivas. É um personagem em busca do seu espaço e ele sai da corte justamente em busca disso. Gostei do autor não ter aliviado a mão e aproveitado a ideia do gênero fluido em todas as suas vertentes. Como a ideia de gênero é uma escolha, a sexualidade caminha por uma outra estrada. Apesar de Akeha escolher um gênero específico, ele vai se relacionar com o próprio gênero. ¨Tem a ver com o sentimento que o personagem tem por outra pessoa, não pelo gênero ao qual ele pertence. O que eu pude extrair, é que no caso deste romance em específico, gênero difere de sexualidade. Uma coisa não teria a ver necessariamente com a outra. Posso estar enganado e aí eu gostaria de ouvir uma outra opinião.
A construção de mundo é muito bem feita. Temos um reino muito inspirado na China e no budismo com um sistema de magias baseado no emprego de cordas (slackcraft). Ao que eu pude entender, me parece que artes marciais e magia são profundamente relacionadas e dominar o slackcraft tem a ver com uma comunhão com as forças da natureza. O emprego dessas magias é feito com muita criatividade como o emprego de água para mover objetos ou da terra para impulsionar o personagem para longe. É uma maneira diferente de enxergar o emprego da magia. Lembrando que o autor tem nacionalidade japonesa e cingalesa. Outro ponto muito legal da construção de mundo e que eu estou curioso para ver mais é a presença de tecnologia neste universo fantástico. O mundo é controlado pelos tensores, usuários de magia, mas existe uma facção chamada de maquinistas, que desejam retomar o controle dos seus destinos. O mundo sobrevive muito por causa da slackcraft, e os maquinistas querem substituir essa dependência através de aparatos mecânicos. Ao longo desse primeiro volume vemos desenvolvimentos mais no sentido de armas com pistolas e bombas.
Enfim, essa novella é uma grata surpresa neste final de ano. Uma escrita muito interessante e sem medo de abordar assuntos complicados, Jy Yang nos leva a este mundo incrível repleto de honra, poder e mistérios. Akeha é um grande personagem que eu tenho certeza que propiciará ótimas histórias e eu estou louco para já ler o volume 2 que se passa um pouco depois do final de Black Tides, mas visto do ponto de vista de Mokoya, gêmea de Akeha.
Ficha Técnica:
Nome: The Black Tides of Heaven Autor: Jy Yang Série: Tensorate vol. 1 Editora: Tor.com Gênero: Fantasia Número de Páginas: 240 Ano de Lançamento: 2017
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