Uma narrativa que mescla altas doses de críticas à religião somadas a uma percepção ampliada da realidade, Valis é um dos trabalhos mais exóticos dentre todos da longa bibliografia do autor.
Sinopse:
A vida de Horselover Fat sempre foi repleta de paranoia e episódios depressivos. Apesar de tentar ajudar os amigos, nunca obteve muito sucesso. Presa de sentimentos confusos e pensamentos intrincados, ele ocasionalmente flertava com a ideia do suicídio. Mas tudo muda quando Fat (ou Phil, a distinção nem sempre é clara) é atingido por um intenso feixe de luz rosa. A partir de então, dá início a uma verdadeira jornada pessoal para entender o que aconteceu: se foi um momento de loucura ou se, de fato, uma entidade divina se revelou para mostrar-lhe a verdadeira natureza do mundo. Transitando entre a mística religiosa, o gnosticismo e a tecnologia extraterrestre, Fat sai em busca de um messias reencarnado que já teria passado pela Terra e acaba percebendo que as fronteiras da realidade começam a ficar cada vez mais difusas. Um dos últimos livros escritos por Philip K. Dick, Valis espelha o conjunto de experiências e ideais teológicos do autor. Sua narrativa quase autobiográfica, repleta de digressões filosóficas e religiosas, é leitura absolutamente essencial para compreender a visão de mundo de um dos mais geniais escritores de ficção do século 20. Extra Esta edição, exclusiva no mundo, inclui o quadrinho “A Experiência Religiosa de Philip K. Dick”, criado em 1986 por Robert Crumb. Nele, o cultuado e controverso artista gráfico narra a experiência mística vivida por Dick que deu origem a Valis.
Essa é uma resenha um pouco difícil de ser feita. Digo isto porque é difícil de encaixar Valis em um estilo literário específico. Alguns críticos dizem que Valis é uma auto-biografia. Não enxergo desse jeito. Apesar de estar claro que Horselover Fat é uma faceta da personalidade de Dick, Valis não fala da vida do autor. Outors enquadram a obra no gênero da ficção científica. Tampouco. Mesmo contendo elementos tecnológicos ou até a presença (discutível) de alienígenas, trata-se de apenas um aspecto da obra.
Valis é uma história sobre Philip K. Dick. Não uma biografia, mas uma leitura pessoal de suas ideias e dilemas. Realmente, como diz na orelha do livro, Dick fala bastante de sua religiosidade. Ao que me parece, o autor busca Deus. Essa busca em um sentido de resolver questões existenciais, de responder o porquê do personagem precisar tomar algumas decisões importantes ao longo da história. Claro que essa busca acaba sendo um ciclo já que ele retorna às suas perguntas iniciais. Mas, esse aspecto da obra combina com a religião apresentada por Dick na obra, o maniqueísmo. Já retorno a essa religião a seguir.
No que diz respeito a uma auto-biografia, Horselover Fat é um alter ego de Dick. Representa uma parte do autor que se envolveu com drogas, com tendências suicidas e um caráter, até certo sentido, ingênuo. A vida de Dick possui uma série de lacunas já que ele sempre foi um recluso por natureza. Muito do que se passa na história pode ou não ter acontecido de fato com ele. Nesse ponto não sei dizer ao certo o quanto o autor misturou ficção com realidade. O que posso dizer com certeza é que a perda de pessoas importantes e próximas de Dick (na história é representada pela morte de Gloria e Sherri) foi um acontecimento traumático para ele. E pior: foi algo corriqueiro. E ele não foi capaz de superar essas perdas levando a um desespero. A busca pela religiosidade ocorre por que o autor deseja saber a razão pela qual essas perdas tiveram que acontecer. Na mente de Dick (e de Fat) estas perdas devem ter tido um motivo; deve haver um plano onde morrer faz algum sentido a partir de um plano espiritual.
Os personagens são bem caracterizados a ponto de eu acreditar que eles sejam realmente reais. Dick nunca foi muito de aprofundar seus personagens, preferindo se focar na trama em si. A história é o meio pelo qual o autor realiza as suas elucubrações. Talvez possamos argumentar que Eric e Linda Lampton sejam realmente personagens, dado o exagero em suas descrições. Esta mistura entre o real e o fictício realmente bagunça a mente do leitor e é algo bacana em Valis. Esta brincadeira de mexer com o que é real ou não chama a atenção na obra do autor.
Maniqueísmo é a religião descrita (ou revelada) por Fat ao longo do livro. Esta é uma religião surgida no final do século II e início do III d.C. cuja característica principal era o sincretismo (a mistura) de várias religiões. Dependendo da região em que o maniqueísmo foi pregado, mais ou menos características foram acrescentadas. Na base de sua existência estava um cristianismo ainda primitivo com elementos helenísticos (gregos com influência do Oriente) em sua filosofia. Helenístico também no sentido do pensamento ateniense, questionando o homem e seu papel no mundo. Características como os sacramentos, as propostas messiânicas e o caráter universal estão presentes aliados a cultos secretos, reuniões comunitárias e um questionamento sobre o que é o real. Mani foi o pregador principal desta divisão do cristianismo e esteve presente na Índia, na China, na Pérsia e no Oriente Médio. Alguns ecos de sua pregação chegaram até o decadente Império Romano onde o imperador Juliano abraçou suas ideias.
Em Valis, Dick brinca com essa pregação e acrescenta tons conspiratórios e de ficção científica à religião. Exposição a luzes, supercomputadores e filmes psicodélicos fazem parte de algumas de suas invenções. Em suma, Valis é uma demonstração de como Dick enxerga a religião. Acredito que ele deva ter tido algum tipo de encontro ou iluminação neste momento de sua vida e decidiu pôr suas descobertas no papel. Fez isto da maneira como só ele sabe: questionando a realidade.
Ficha Técnica:
Nome: Valis Autor: Philip K. Dick Editora: Aleph (no Brasil) Gênero: Ficção Científica? Tradutor: Fábio Fernandes Número de Páginas: 312 Ano de Publicação: 2014
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