Sebastián é um investigador particular. Ele é contactado por Cacau, uma misteriosa mulher que deseja saber sobre uma parte de seu passado. Em um mundo em que as memórias podem ser manipuladas com facilidade, o que acontece quando uma parte dela parece ter desaparecido e você não sabe como isso aconteceu?
A ideia deste conto é incrível: uma história noir com toques de ficção científica. Brincar com memória sempre produz bons resultados dependendo da maneira como o autor ou autora vai manipular o estilo para se adequar àquilo que foi pensado. O curioso é que o elemento de ficção científica é tão suave que o leitor nem vai perceber na maior parte do tempo. Isso é algo bem comum na escrita da H. Pueyo: o gênero não determina o enfoque da história. Ele está ali como uma ferramenta possível de ser usada. Se podemos dizer de uma autora que mais se aproxima de uma escrita borgeana, essa é a Pueyo. O realismo mágico tem essa característica principal: a fantasia é parte integrante da história, não a sua essência. No gênero fantástico, geralmente a fantasia acaba sendo fundamental para que caminho a história vai tomar. No realismo, não. Por isso, dá até para a gente sair do guarda-chuva do realismo, e colocar esse conto na linha de uma ficção especulativa.
Cacau e Sebastián são os protagonistas desta história. Sebastián é um investigador particular que saiu de seu trabalho como policial por conta de um trauma no passado. Algo que ele não deseja se esquecer através da manipulação de sua memória. Quando Cacau entra em sua sala, ele já percebe que algo vai ser diferente. Ela contrata seus serviços para que ele recupere parte de sua memória que simplesmente desapareceu. Seis meses de sua vida que Cacau não sabe o que fez. Pelo menos isso é o que ela diz ao protagonista. Mas, logo Sebastián percebe que existe algo mais na história de Cacau que não está sendo dito.
Podemos entender Cacau como uma co-protagonista ao lado de Sebastián. Embora ele tenha o seu plot na história, seu papel na narrativa é funcionar como um personagem-orelha. Cacau é a "narradora" não-confiável. Coloquei entre aspas porque a narrativa é escrita em terceira pessoa, onisciente. Como o foco está em dois personagens, não há a necessidade de mudar núcleos narrativos. Mesmo assim percebemos o quanto o narrador oculto e onisciente sabe acerca da história. Entre desvios, desinformações e enganos, o leitor precisa aumentar sua atenção para descobrir o que é verdade e o que é mentira.
A investigação vai começar a revelar detalhes bem escabrosos, principalmente quando Sebastián começa a conseguir montar as peças do quebra-cabeças. Se envolver com a personagem não vai ajudar nem um pouco em sua investigação, principalmente quando as coisas se tornam mais pessoais. Adoro como histórias que tem a memória como um de seus temas conseguem bagunçar tanto a nossa cabeça. Não vou contar mais porque corro o risco de dar algum spoiler. Sei que isso já está se tornando um hábito, mas só tenho a recomendar mais esse conto da Pueyo. É fácil dizer o quanto suas histórias me encantam. Não canso de ler algo escrito por ela.
Ficha Técnica:
Nome: Você vai se lembrar de mim
Autora: H. Pueyo
Editora: Revista Trasgo
Número de Páginas: 38 (formato A5)
Ano de Publicação: 2019
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