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Foto do escritorPaulo Vinicius

Resenha: "É assim que se perde a guerra do tempo" de Amal El-Mohtar e Max Gladstone

Em um dos vários campos de batalha entre duas facções que lutam pelo controle das várias linhas temporais, Red conhece Blue. O que começa como uma intensa rivalidade se torna algo mais. A fome das duas uma pelo amor da outra vai colocar em perspectiva o papel delas nessa longa guerra.



Sinopse:


Uma história que atravessa tempo e espaço para narrar o destino de duas viajantes do tempo rivais que se apaixonam e precisam mudar o passado para garantir um futuro juntas.


Entre as cinzas de um mundo em ruínas, uma soldada encontra uma carta que diz: Queime antes de ler.

E assim tem início uma correspondência improvável entre duas agentes de facções rivais travando uma guerra através do tempo e espaço para assegurar o melhor futuro para seus respectivos times. E então, o que começa como uma provocação se transforma em algo mais. Um romance épico que põe em jogo o passado e o futuro.

Se elas forem descobertas, o destino será a morte. Ainda há uma guerra sendo travada, afinal. E alguém precisa vencer.





Quando dizemos que o amor pode vencer todos os obstáculos, pode parecer água com açúcar. Ou clichê. Mas, um sentimento como esse que deixa nosso coração faminto pode nos levar a realizar feitos inacreditáveis. Mesmo uma guerra que acontece há muitos anos pode ser afetada quando dois corações desejam um ao outro. E esse vai ser o tema de É assim que se perde a guerra no tempo onde Amal El-Mohtar e Max Gladstone escrevem poesia na forma de literatura. Daquelas que a gente lê, suspira e aprecia. Apesar de ter essa pegada mais romântica, ele não deixa de nos apresentar uma temática de contradição entre a harmonia e o controle. O que é mais importante: nos adaptarmos ao meio ou manipularmos o que nos cerca?


Há eras uma guerra é travada entre Jardim e a Comandante. Várias linhas temporais estão em jogo, e os agentes de cada uma das facções realizam missões onde mundos tem seus fatos alterados para permitirem a sobrevivência de seu lado. Jardim é uma facção de manipulação corporal e seus integrantes valorizam o meio assim como ele é. Suas interferências no tempo costumam ser mortais porque a natureza não perdoa aqueles que a alteram. Seu objetivo final é se harmonizar com a linha temporal em que vivem permitindo que a vida floresça a seu tempo. Já o lado da Comandante é mais tecnológico. A partir de modificações corporais, agentes melhores são criados. No entendimento deles, apenas pela interferência da agência é que as linhas temporais poderão ser melhores. É necessário maximizar o potencial de cada fio. Objetos são inseridos, descobertas são estimuladas, obstáculos são eliminados. Um dia, Red, uma agente a serviço da Comandante, encontra uma carta escrita por Blue, sua rival de Jardim. Blue havia se dado conta da presença de Red e o quanto ela era habilidosa. Inicia-se uma brincadeira de gato e rato entre duas inimigas que desenvolvem um profundo respeito mútuo. Desse respeito nasce uma necessidade de uma pela outra até redundar em um sentimento verdadeiro entre elas. Mas, poderá esse sentimento resistir a uma guerra que dura desde muitas gerações antes de elas existirem?


Esse é um daqueles romances escritos por várias mãos. Mas, o estilo narrativo é tão bom que a diferença entre as escritas dos dois autores é quase imperceptível. A história é contada em terceira pessoa de uma forma mais puxada para a narrativa de acontecimentos (nada muito descritivo e os diálogos são bastante esparsos). Os capítulos são bem curtinhos, dando espaço para a troca de cartas entre as personagens. Esse é o ponto alto da trama. Adoro essa forma de comunicação. Como elas não podem se aproximar uma da outra, elas deixam mensagens uma para a outra em lugares bem exóticos. Esta troca de cartas dura o livro todo e onde as personagens se abrem uma para a outra revelando seus medos, suas ansiedades e até contando um pouco sobre si mesmas. O que começa como uma troca de bravatas se transforma em algo mais. A narrativa é repleta de metáforas e simbolismos. Isso pode dificultar bastante a leitura para algumas pessoas. Não chega a ser uma ficção científica pesada, mas em alguns momentos é possível se perder ou precisar ler algum trecho mais de uma vez. São trocas de bravatas e carícias entre duas pessoas que só conseguem se comunicar através de palavras.


A história também nos coloca de dois lados diferentes da guerra. O que é mais importante: se adaptar ou modificar? Não interferir ou adequar? Essa é uma dinâmica que existe há milênios na humanidade. Desde que os povos da Mesopotâmia começaram a criar diques nos rios Tigre e Eufrates para poder levar água para as cidades que nasciam e irrigar as plantações. A obtenção de recursos naturais se tornou essencial para o desenvolvimento das diversas civilizações. Mas, desde o século XIX esse processo de extração se tornou predatório para a natureza à medida em que devastamos quilômetros e mais quilômetros de matas, poluímos os rios com dejetos da produção industrial e até perfuramos o subsolo em busca de matéria-prima para criação de combustíveis fósseis que passaram a ser atirados na atmosfera. Caminhamos hoje para uma noção de economia verde em que buscamos refletir sobre as nossas ações para o planeta. E é nessa verve que caminhamos para esse questionamento. Qual é a melhor abordagem? Se apenas deixamos as coisas do jeito que elas estão, não temos como prever a natureza, já que ela tem o seu próprio funcionamento. Ao mesmo tempo chegamos a um ponto em que continuarmos com o nosso atual modo de vida vai levar a um processo de extinção do planeta em que vivemos.


Em relação às duas personagens, os dois autores usaram bastante da ideia de Romeu e Julieta, de William Shakespeare. Dois lados de um conflito em guerra e pessoas que estão no meio do furacão acabam se apaixonando uma pela outra. Será possível para essas pessoas impedir que uma guerra como essa continue? Me recordo de um trecho em que Red reflete o quanto a guerra entre a Comandante e Jardim se tornou estúpida. Elas nem sabem como a guerra se iniciou, apenas que os lados tem visões diferentes para as linhas temporais. A guerra acaba não escolhendo a quem vai afetar. Pessoas inocentes acabam sendo tragadas para algo que não foi planejado por elas. Podemos falar o que quisermos sobre a guerra: ela não tem nada de bela e romântica. Red e Blue nos oferecem uma perspectiva única sobre como elas encaram aquilo que as cerca. Red com sua personalidade abrasadora e faminta; Blue com seu jeito contemplativo. Duas pessoas que se complementa e precisam sofrer diante de tamanha violência e desconfiança ao qual elas precisam sobreviver.


Já tinha ouvido falar o quanto essa história foi premiada. E tinha ficado curioso a seu respeito. A narrativa criada por Amal El-Mohtar e Max Gladstone é incrível e de uma sensibilidade única. A linguagem empregada é repleta de poesia e flores. Pode incomodar a alguns leitores, mas a mim só me agradou a maneira como ambos dançaram um tango um com o outro explorando as diferentes facetas da arte de amar. Fica o meu alerta para os incautos de que é preciso ler esse livro com calma de forma a apreciá-lo melhor. Por conter uma quantidade enorme de metáforas e simbologias, pode não ser uma leitura tão fácil quanto parece. No mais, é tentar absorver as mensagens implícitas no texto.











Ficha Técnica:


Nome: É assim que se perde a guerra do tempo

Autores: Amal El-Mohtar e Max Gladstone

Editora: Suma

Tradutora: Natália Borges Polesso

Número de Páginas: 192

Ano de Publicação: 2020


Link de compra:


*Material enviado em parceria com a Editora Suma











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